ROBERTO VIEIRA, a vida em silêncio ruidoso
Após um período e rico experimentalismo com o grupo oficina, em Belo Horizonte, Roberto Vieira volta a Juiz de Fora. Solitário, realiza uma série de pinturas intituladas “paisagens”. Nelas aparecem as montanhas da Zona da Mata em processo de erosão, a vegetação e o céu. Cada elemento com seu espaço definido e existência quase autônoma.
Uma natureza despovoada, mas repleta de cor e luminosidade. As cores são puras e limpas, a luminosidade é conseguida a partir da gradação tonal dos planos de cor. Esses mesmos planos que formam as nuvens, morros e árvores apresentam-se entrecortados, trazendo ritmo e pulsação à paisagem.
O processo construtivo se revela quando percebemos que o quadro é composto por pequenas plaquetas de cor esmagadas por uma espátula contra a superfície lisa e rígida do duraplac. Pequenos grãos de cor, como os grãos de areia levados pela água e o vento no processo da erosão. A erosão não é aqui sinônima de perda, de ruína, de dor.
O quadro não se faz denúncia aos sentidos. O tempo, a transformação e a construção também estão presentes na série de “Terras” do final dos anos 70. Da plaqueta de cor o artista passa à própria terra. São caixas a mostrar elementos orgânicos em decomposições ou montagens com madeira e argila, As pequenas folhas do jardim, o húmus, os fungos…são retidos não por um discurso sobre a morte, mas sobre a silenciosa e inexorável transformação da vida. Embora enclausurada, suspensa em uma parede, a vida se renova e se impõe sem alarde…talvez a única salvação para o artista.
Se as paisagens luminosas e coloridas eram despovoadas, as caixas com hastes de madeira e argila lembram as construções de pau a pique, marcas da presença do homem que trabalha diretamente sobre a terra e com ela se abrigam. As hastes de madeira foram cuidadosamente colocadas na argila revelando o desejo de estruturação.
O cruzamento constante de linhas verticais e horizontais, contrastam com o ritmo desordenado, solto e natural do ressecar da terra. Em alguns momentos, o artista experimenta a dualidade entre o representar e o aprisionar a matéria em si. Sobre o “pau-a-pique”, a encobrir-lhe apenas o centro, um pedaço de tecido pintado reproduz a estrutura da matéria que oculta. O artista propõe a continuidade entre o ser e sua negação ou entre o ser e seu simulacro, ou, ainda, entre o ser e sua revelação. O observador é instigado a refletir sobre o fazer artístico contemporâneo.
Maraliz, 1996